Aparecida dos Santos, em andrajos, com uma criança faminta no colo,
disse:
- Clarinha, mamãe vai levar você num lugar em que a alimentarão,
dar-lhe-ão roupas e você não passará mais fome e nem frio. Quando eu puder,
voltarei para lhe buscar.
A menina, de seis anos, chorava.
- Não quero ficar longe da senhora.
O coração de Aparecida doía, tamanho era o sofrimento. Mas, não houve
jeito. Tinha que ser assim. Ela colocou a filha no chão, em frente a um
orfanato e falou:
- Filha, fica aí. Vou tocar a campainha e quando alguém aparecer, diga
que eu fui embora procurar emprego e que quando eu puder voltarei.
As duas em pranto, deram um abraço apertado. Lágrimas se misturaram. A
mulher, após apertar a campainha, foi embora rapidamente. A criança foi
recolhida e após dois anos foi adotada por um simpático casal que desejava
muito ter uma filha. Com o tempo, a menina parou de chorar. Teve imenso carinho
dos pais adotivos, mas sempre desejou saber notícias de sua mãe. Cresceu
inteligente e formou-se em medicina.
Certa tarde, estando a fazer a visita costumeira aos pacientes no
hospital, ao auscultar uma senhorinha, percebeu que uma paciente no leito ao
lado, estava imersa em aflição. Os gemidos baixos se perdiam no quarto. A
doutora, penalizada, aproximou-se da mulher e viu que ela não tinha o dedo
indicador da mão direita. Lembrou-se de sua mãe, que também não tinha o dedo
indicador da mão direita. Numa briga com o ex-marido, havia tido o dedo
decepado. Prestou atenção na cor da pele, nos olhos, na boca... meu Deus,
pensava... será ela? Tão parecida com minha mãe!
Aproximou-se e perguntou:
- Qual seu nome, senhora?
- Aparecida dos Santos.
- O que aconteceu em sua mão?
- Há muitos anos, meu ex-marido decepou meu dedo.
Ansiosa, a doutora perguntou:
- Tem família?
- Tenho uma filha que não sei onde está... meu anjinho... tive que
abandoná-la num orfanato. Não pude voltar para pegá-la, pois me faltou emprego,
roupa e pão. Hoje vivo da caridade dos bons. O câncer se desenvolveu em mim
devido a angústia. Mais um tempo e partirei sem ver minha filha. Peço sempre
para que Deus me ajude a ver minha menina pela última vez.
- Como é o nome de sua filha?
- Clara Aparecida dos Santos, minha Clarinha.
- Qual orfanato a senhora deixou sua filha?
- No orfanato Santa Cecília.
- Em que ano?
- 1970.
Clara, abaixou e abraçou sua mãe.
- Sou eu mãe, a sua Clarinha. Como esperei por esse momento!
Fartas lágrimas se extravasaram. Lágrimas de grande emoção, de alegria.
Enfermeiras chegaram, médicos também... palmas e louvores... gratidão eterna,
Senhor!
É por isso, meus irmãos, que temos que confiar em Deus. Clarinha me
levou para sua casa. Seus pais adotivos me cumularam de atenção. Ganhei roupas
boas e alimentação farta. Vivi ainda um ano e meio tendo o carinho de minha
filha. Morri feliz e aliviada em seus braços. Deus é bom para quem tem fé. E eu
tive, sabia que veria novamente a Clarinha.
Com amor, dedico minha história a todas as mães que não jogam seus
filhos no lixo, às mães que tudo fazem para preservar a vida de suas crianças.
Maria Aparecida dos Santos
Psicografia: Maria Nilceia
12/04/2021